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Atrás do Sorriso

Passeando pelos jardins, com o neto de mão dada e sorriso no rosto, António ia respondendo às centenas de perguntas que o pequeno lhe ia fazendo:
-Avô, Avô, o que é a guerra?
-Onde ouviste essa palavra?
-Ontem na TV.
-A guerra acontece quando as pessoas não se entendem.
-Hum! Então, quando no infantário discuto com o Miguel porque ele me roubou os brinquedos, é guerra?
-Mais ou menos isso!
-Sabes avô! Ele é o meu melhor amigo! Discuto com ele mas depois vamos brincar. Os adultos quando estão em guerra também brincam depois?
-Brincar, brincar, não, mas depois de algum tempo acabam por fazer as pazes.
-Não falemos mais nisso agora, João! Vamos andar de escorrega. Estamos a chegar!
-Vamos!
Após a primeira escorregadela, João parou muito pensativo, sentado:
-Que foi? Magoaste-te? – Questionou logo o avô.
-Não! Fiquei a pensar na guerra!
-João, esquece isso!
-Tu já estiveste na guerra?
O idoso, tentando manter a boa disposição característica.
-Sim, já!
À sua memória, vieram as recordações da guerra colonial, dos pesadelos que ainda o acordam a meio da noite, das imagens que tenta esquecer mas que lhe vêm à mente quando menos espera. As lágrimas começaram a encher-lhe os olhos contra a sua vontade. Tentava manter o sorriso para que João não reparasse.
-Avô, estás triste? Nunca te tinha visto assim!
-Nada! Foi um cisco que entrou para dentro do olho! Queres que te conte a história de um gato que comia o queijo do rato?
-Quero! Vou só escorregar mais uma vez e depois contas-me.

Texto de participação Fabrica das Letras, sobre o tema de Setembro: Fingimento

Comentários

Eva Gonçalves disse…
Muito bonito este teu texto. Mais profundo do que habitualmente, consegues descrever a cena, sem esquecer as emoções das personagens... gostei bastante. beijo
Obrigado Eva, escrevi para a Fábrica das letras, sob o tema: fingimento mas ele ainda não actualizaram.
Joana disse…
fantástico. a guerra marcou a minha mãe. por isso entendi melhor.
Obrigado. A guerra colonial fez parte da nossa história mas é esquecida e fazem muitas vezes de conta que não existiu.
Paula noguerra disse…
Linda mensagem!!!!
Uma linda forma de ocultar a dor que se sente!
Bjs doces e obrigada pela tua visita no meu espaço xxx
Paula, o sorriso faz milagres:)
Unknown disse…
Confesso que já tinha saudades destes teus textos ;) bjos e parabéns pelo novo blog
Obrigado phil...
Fi ♥ disse…
Gostei, gosto sempre não me canso de dizer:)
Lá da Fabrica de Letras vim aqui te visitar,gostei muito,emoção a flor da pele,abreijos
Isa disse…
Gostei!
A guerra colonial também faz parte da minha história. Foi uma forma de falar do fingimento saudável!

Beijos
Utópico disse…
São tantas as vezes que por vezes, a fim de os proteger e, não por maldade, temos que fingir às crianças...

... mas custa tanto.

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