-Sou grande, poderosa e forte- Cantava alegre uma enorme rocha de granito, algures numa montanha Transmontana.
-Chuva, sol e vento, nada me afeta e ninguém me detém!
Ao seu lado, mesmo encostado a si, um grão de areia muito pequeno e quase invisível, ouvia calado.
-Sou tão forte que os insetos se escondem debaixo da mim para se protegerem. Sou tão grande que os pássaros pousam em mim para poderem ver o se passa sua volta. Sou tão resistente que muitas plantas me escolhem como sua casa.
O pequeno grão de areia, suspirava. Sentia um misto de cansaço com inveja. Não tinha nenhuma destas qualidades. Era apenas um entre milhares. Os dias passavam-se e deu por si a perguntar para que servia de facto. Não protegia ninguém.
A única felicidade que tinha eram as festas. Sim as festas de areia. Todos os dias, pela hora do calor. Quando o sol batia nas faces dos pequenos grãos, refletia no ar luzes das mais variadas cores. O calor aquecia os seus corpos, que encostados uns aos outros emitiam sons. Nas tardes mais quentes, pequenas faíscas surgiam no meio das danças.
A rocha, essa continuava, todos os dias, com a sua ladainha e lá do seu alto nunca se apercebeu das festas, nem tinha a audição suficientemente apurada para ouvir as melodias da areia.
Certo dia, no início do Inverno. O céu havia acordado nebulado e coberto de densas e escuras nuvens. Tudo indicava que nesse dia não haveria festa.
Certo dia, no início do Inverno. O céu havia acordado nebulado e coberto de densas e escuras nuvens. Tudo indicava que nesse dia não haveria festa.
Nestas alturas do ano, restava aos pequenos grãos deixar-se ficar e esperar.
Do norte, começou a soprar um vento forte que fazia voar os ramos das plantas secas. A chuva começou a cair. Os pequenos grãos de areia, aproximavam-se uns dos outros para não serem atingidos pelo temporal.
O pequeno grão de areia, debaixo da enorme rocha, tremia de medo.
-Não temam, todos os que em mim se acolhem eu os protejo. Nada me atinge.
O vento soprava cada vez mais intenso. O pequeno grão fechou os olhos para não ver o que se passava. De repente, sentiu uma força invisível agarrar em si. O medo apoderou-se das suas forças e começou a chorar. Fechou os olhos com todas as suas forças. Deixou de sentir os seus amigos grãos e a sua rocha. Foi arrastado pelo ar.
Assim que levantou voo, ouviu um estrondo enorme, seguido de outros. Uns mais fortes, outros menos, até que um estalo se sentiu. Algo se havia partido. O seu medo o impediu de ver. Os olhos continuavam cerrados.
Passadas algumas horas, caiu. O vento parou. Continuou ainda alguns momentos de olhos fechados até que começou a sentir o calor do sol no seu corpo. Lembrou-se das festas de areia, sorriu e decidiu ver o que se passava.
Estava no vale da montanha, junto ao caule de uma árvore. Olhou em volta a procura da sua rocha e nada viu. Apenas umas pequenas pedras estavam junto a si. Pareciam ter sido cortadas recentemente. Nunca tinha visto, nem sabia que as pedras poderiam ser partidas ou cortadas.
O seu novo local parecia muito mais belo e verde. Havia muita vegetação. As aves pousavam em cima dos ramos da árvore e cantavam deliciosamente. Não tinha tanto sol, porque as sombras das folhas o tapavam mas sentia-se bem.
No meio da melodia começou-se a ouvir chorar. O pequeno grão de areia olhou em volta e não sabia de onde vinha tamanho lamento até que, uma voz se começou a fazer sentir:
-Um dia, fomos um todo forte, grande e poderoso. Hoje somos apenas várias partes.
O grão de areia, olhou com mais pormenor para as pequenas rochas.
-Ah, a minha rocha grande! – referiu espantada.
- Sim, quando o vento te fez voar, começamos a baloiçar. Saíste debaixo de nós e ficamos sem suporte. Não conseguimos aguentar e viemos pela montanha abaixo aos saltos. Batemos noutras rochas e partimo-nos.
O sol estava forte e passava através dos ramos. O pequeno corpo do grão de areia tocava nas pedras e emitia uma nova música. As pedras pararam de chorar e sorriram. A festa da areia e das pedras começou.
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