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Mensagens

Livro sem memórias

 Era uma vez um livro. Um livro largado numa estante. Um daqueles livros com capa vermelha, rija e sem desenhos. Era um livro tão sem graça que ali estava a acumular pó. Já não se lembrava da última vez que o tinham aberto para ler. Aliás, tinha sido há tanto tempo que até ele próprio já nem se recordava do que tinha escrito nas suas páginas. A sua dona tinha falecido e o livro ficou para a filha, a Leonor, que o guardava numa prateleira como recordação da sua mãe. Essa sim o abria todos os dias, quando Leonor era pequena, para lhe contar uma das histórias do livro. Ela, contudo, nunca teve tempo para o ler à sua filha, Maria, e as memórias das histórias desapareceram com o tempo da sua memória. Certo dia, a professora da Maria pediu que ela levasse um livro com histórias diferentes e ela pediu à mãe: – Oh, querida! Leva um bonito, com belas imagens! – Mas mãe, todos os meus amigos têm um livro desses e as histórias são todas iguais. – Então não sei! Agora a mãe não pode! A...
Mensagens recentes

Alex, o caracol surfista

Era uma vez um caracol chamado Alex, que vivia num arbusto em Aljezur, junto dos seus cinquenta irmãos, perto da praia da Amoreira. Adorava sentir o vento e, sobretudo, a brisa fresca do mar. Os seus dias preferidos eram os de nevoeiro. Acordava com a carapaça coberta de gotas de água fria e salgada e escorregava pelos ramos como os surfistas da praia. O sonho de Alex era ser surfista. Nesses dias, fechava os olhos e imaginava que tinha uma carapaça colorida como as autocaravanas e que usava uma prancha debaixo do seu corpo. — Yupiieee! — dizia ele. Os seus irmãos odiavam a brisa do mar. Gostavam de estar sossegados e só saíam da carapaça para dar umas trincas nas estevas. Achavam que ele era doido e, por isso, deixavam-no sempre na base do ramo onde viviam. Ele não se importava nada, porque assim podia escorregar pelas gotas do orvalho. Certo dia, viu uma menina a passear junto à praia, de mão dada com os seus pais. Os seus irmãos esconderam-se todos nas carapaças e agarraram-se...

Mulher

Ser mulher é : perceber o que ninguém vê, levantar quando já ninguém se ergue, ter força quando já ninguém se mexe, resolver o que já ninguém consegue, esquecer a dor pela dor de todos, descansar no descanso dos outros, Ser mulher é ter a força de um gigante com a delicadeza de uma flor.

O sonho do André

André tinha um sonho. Adorava brincar ao ar livre, nos jardins e parques da cidade. Gostava de saltar de pedra em pedra, como se estivesse a jogar na calçada portuguesa, mas, sempre que o fazia, sentia-se um bocadinho triste. E sabem o que o fazia sentir-se assim? O lixo espalhado pelo chão. André gostaria de ter uma vassoura mágica que varresse tudo ou uma borracha gigante que apagasse o lixo e um pincel para voltar a colorir de verde os jardins e de cinzento os passeios. Não conseguia perceber por que razão as pessoas deitavam lixo no chão quando havia caixotes espalhados pela cidade. Gostava de pensar que as pessoas não podiam ser tão descuidadas assim. Imaginava que existia um monstro do lixo que, ao tentar comer o lixo dos caixotes, deixava cair pelo chão pacotes de sumo, latas de cerveja e muitas outras coisas. Certo dia, na escola, a professora pediu a todos que desenhassem o que gostariam de ser quando fossem grandes e escrevessem um pequeno texto sobre isso como trabalho de ca...

A Dança das Alvéolas

Era uma vez uma pequena alvéola chamada Aurora, que vivia com a sua família num beiral de um telhado de uma casa antiga em Lisboa. A pequena Aurora era filha única e vivia com o seu pai, Augusto, e a sua mãe, Alice. Tal como todas as pequenas aves, ia todos os dias para a escola mais perto de sua casa. Era num parque urbano amplo e calmo, onde a professora Arménia ensinava a arte de ser uma alvéola-branca. Aprendiam a procurar comida, a afastar-se dos perigos, a esconder-se dos humanos e, sobretudo, a dançar. Sim, um dos principais ensinamentos era a Dança das Alvéolas, onde aprendiam a abanar a cauda. Escusado será dizer que esta era a disciplina preferida da maioria dos alunos. Bem, quase todos, porque a Aurora não conseguia abanar a cauda. Certo dia, a professora Arménia avisou que os pais poderiam, se quisessem, assistir à próxima aula de dança. Todos ficaram muito felizes, inclusive a Aurora. Contudo, após contar aos pais e notar o imenso entusiasmo deles em assistir, Aurora ficou...

Jóia azul

Era uma vez um ourives chamado António, que criava peças de ouro e pedras preciosas. Vivia num vale distante, no meio de montanhas geladas, com a sua mulher e a sua filha. O seu maior sonho era tornar-se o Ourives Real e fazer a peça mais bonita alguma vez vista para a Rainha Luz. Trabalhava de sol a sol para aperfeiçoar as suas criações, e o fruto do seu esforço começou a espalhar-se de boca em boca. Certo dia, o Rei Pedro chamou-o ao Palácio Real para o convidar a apresentar a sua melhor, mais valiosa e rara tiara, para que o Rei a pudesse oferecer no Dia dos Namorados. Se a Rainha Luz gostasse, António tornar-se-ia o Ourives Real. Luz era muito bela e bondosa, ao contrário da sua irmã, Gélida, que era vil e cruel. Gélida era a filha mais velha dos condes que o velho Rei André convidara para apresentar as suas filhas ao seu filho e atual Rei, Pedro. Pedro enamorou-se de Luz e ignorou Gélida, que, desde então, nunca mais foi boa. Tudo o que Luz tinha, Gélida cobiçava e fazia tudo para...

O moinho dos Sonhos do Mestre André

  — Avô, de onde vêm os sonhos? — perguntava o João. — Bem, os sonhos vêm do moinho dos Sonhos do Mestre André! — Quem é o Mestre André? — O Mestre André é o homem mais velho do mundo, que vive no topo de uma montanha, num moinho de vento. — A sério? Já alguma vez o viste? — Nunca ninguém o viu. Ele vive apenas com os seus amigos. — Quais amigos? — O vento e o Dragão dos Sonhos! — Uau, um dragão! E como é que ele fabrica os sonhos? — Como um moinho de vento normal. O João ficou baralhado, porque já tinha visitado um moinho de vento e, de lá de dentro, só saía farinha. — Isso não faz sentido, avô! No moinho que visitei, havia um senhor que colocava grãos entre duas grandes pedras chamadas mós. Elas rodavam e esmagavam os grãos, transformando-os em farinha. Esse movimento era gerado pela força do vento, que fazia girar as pás do moinho. — Pois, neste moinho, o Mestre André também põe uns grãos especiais, que são esmagados pelas mós. Depois, sai uma farinha mág...