Toca a mexer...

imagem: montagem de fotos da net
Na tasca do Sr. António, a sangria é a bebida dos Deuses da casa. Não há cliente que lhe resista.
A gasosa é deitada com cuidado seguida do vinho e bebidas secretas. A fruta é da Dona Felisberta da praça que a reserva todos os dias de manhã, para o efeito.
-Sr. António! Tem que dizer o segredo! É das bebidas? – Afirmavam os clientes.
Ninguém sabia ao certo. Alguns ex-empregados que haviam mudado de restaurante, convencidos do sucesso, não tinham conseguido vingar. Levavam a receita que o Sr. António lhes ditava, mas nada. Não conseguiam fazer igual.
A laranja era a primeira das frutas e componente fixo, o resto era consoante as épocas.
-Vamos lá cambada! Tudo a mexer!
-Colher, fala mais baixo senão ainda te ouvem! – Pediu Sr. António à sua colher falante.
- Não ouvem nada! Só tu é que ouves e estas preguiçosas! Mexam essas cascas! Vá, maçã! Espreme-te!
Toda a fruta treinava dentro do jarro. Este era o seu segredo, passado de gerações em gerações: uma colher de pau especial.
-António, hoje, trouxeste morangos. Vai ser difícil, já sabes!
-Vá lá! Não tenhas mau feitio! Os clientes gostam do sabor.
-Até podem gostar mas fico de rastos ao treiná-los. São umas lesmas. Vá mexam-se!
Atrás da porta, o empregado novo ouvia o Sr. António a falar sozinho. Quando o dono terminou, entrou à socapa na cozinha e roubou a colher. Nunca mais regressou.
No dia seguinte, Sr. António, um pouco antes do almoço, procurou a colher desesperadamente e não a encontrou. Os seus clientes esperavam, esperavam e começavam a ficar impacientes.
- Toc toc toc! – Estremecia alguma coisa dentro da gaveta.
O dono do restaurante abriu-a e:
-Snif! Snif! Raptaram minha mulhé!
Sr. António, não queria acreditar no que os seus olhos viam, um rolo da massa a chorar:
-Tu, tu, falas?
-Sim, não queria soubesse mas a urgência me forçou.
-Sabes o que aconteceu?
-O teu empregado novo a levou!
-E agora? Agora o que faço? Logo, posso ir correr atrás dele mas tenho os clientes todos à espera de sangria.
-Hummm, promete que não desiste até a achá?
-Sim, prometo.
-Então, posso fazer uma caipirinha. Só sei esmagar. Tem limas?
-Ai, meu Deus! Será que resulta?
Sem alternativa, Sr. António vai à sala, levanta a voz e fala aos clientes:
-Hoje, excepcionalmente vamos servir caipirinhas ao invés de sangria. Quem quer experimentar?
-Eu! – referiu um cliente.
O dono do restaurante foi á cozinha e seguiu as instruções do rolo da massa. Ele levantou-se e com a ponta do cabo, começou a esmagar, a esmagar. Passado algum tempo lá saiu o primeiro copo.
Levou-o à mesa com muito cuidado.
-Humm, humm, hummm…
-Sim, gostou?
-Hummm, é divinal…
-Eu também quero!
-Eu também!
Todos ficaram satisfeitos.
No dia seguinte encontraram a colher. Nessa noite, foi servida as melhores sangrias e caipirinhas de sempre.
-Vá toca a mexer suas preguiçosas!
-Se encosta a mim, lima! Se encosta!
-Rolo, não te estiques! Olha que eu sou fina mas sou rija!

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